
Aqui há uns dias pediram-me para fazer de Capuchinho Vermelho. Empurrei uma écharpe vermelha por cima da cabeça e tentei pôr o meu ar mais angelical. A filhota deu dois passos para trás, olhou-me como um encenador experiente e depois de ponderar dois ou três segundos deu-me a sua aprovação: “Estás bem.”. Perguntei-lhe quem iria ela ser, e ela respondeu que seria o lenhador. Foi até à porta do quarto e deu meia volta. Quando voltou já encarnara o papel: “Eu sou o Lenhador, menina Capuchinho Vermelho... Não tenha medo... Eu vou protegê-la!”. “Proteger-me do quê?” perguntei-lhe com um ar supostamente espantado. “Do Lobo Mau que está além escondido atrás das árvores...” respondeu-me fingindo um ar amedrontado e apontando para o armário. Olhei em direcção às “árvores” e exclamei: “Ah! Eu não tenho medo... Onde é que ele está? Onde é que ele está que eu já lhe digo...”. A filhota fez um ar algo atónito e murmurou... “Não... Não... Que o Lobo é muito mau, menina...”. Eu lancei-lhe um ar incrédulo, levantei-me, fui até ao armário e fingi dar um murro no topo da cabeça do lobo que se escondia atrás dele. “Pronto. Já está. Não há mais Lobo Mau!...”. A filhota olhou-me com um ar ainda mais incrédulo. Por momentos pareceu-me uma actriz deixada sem deixas. Mas enganei-me. Ela lançou-me um meio sorriso e do topo dos seus quatro anos recordou-me: “Oh mãe... Há muitos lobos por aí...”. Pois há filhota. E logo a seguir, quando foste outra vez até à porta do quarto, deste meia volta e voltaste, mostraste-me que também já sabias outra coisa... Porque me disseste: “Menina Capuchinho Vermelho... Não tenha medo! Eu sou o Lobo Bom mas não lhe faço mal!... Também há lobos bons, sabe?...”.