
"Pus dois solinhos no meu desenho...".
"Porquê, bebé?".
"Porque um só era pouca luz...".
(extracto de uma manhã de sábado com a filhota)
...tudo o que possamos escrever será sempre o sub produto de qualquer coisa...
...
É dado assente que o universo se encontra em expansão. Isto foi demonstrado e sustentado pela, entre outras provas, existência dos quasares (como eu adorava poder ver um!).
Se restasse alguém vivo para contar a história depois de tudo abraçar esse ponto, talvez lhe chamasse o Big Glup.
Acontece que descobertas recentes vêem postular exactamente o contrário (não estou seguro que já haja provas concretas, daí, por precaução, lhe ter chamado postulado). Mas então, o que foi que se descobriu agora? Muito simplesmente que a gravidade cósmica nem sempre “obedece às mesmas regras” da terráquea e que, em circunstancias particularíssimas, em vez de atrair pode repelir (espantoso, não é?).
Ora isto implica que os corpos celestes quando chegarem àquele ponto em que supostamente voltariam para trás, não só não o farão como ainda acelerarão o seu movimento em direcção ao infinito. Aliás, a uma quantidade de infinitos. É claro que nunca atingirão nenhum infinito – como se isso fosse possível. A energia fatalmente ir-se-á perdendo, gastando, consumindo até não restar… nada. Apenas um gigantesco universo de escuridão.
Bom, quer seja duma maneira ou de outra, que ninguém se preocupe. Será daqui a tanto, tanto tempo, tempo quase imedível, que do ser humano nem sequer memória haverá. Nem dos humanos nem de quaisquer outras formas de vida biológica. Se for esta a única forma da vida ser vida, ela desaparecerá.
A vida terminará, o que, na minha opinião, faz todo o sentido.
Não desejei senão estar ao sol ou à chuva —
Ao sol quando havia sol
E à chuva quando estava chovendo (E nunca a outra cousa),
Sentir calor e frio e vento,
E não ir mais longe.
Uma vez amei, julguei que me amariam,
Mas não fui amado.
Não fui amado pela única grande razão —
Porque não tinha que ser.
Consolei-me voltando ao sol e à chuva,
E sentando-me outra vez à porta de casa.
Os campos, afinal, não são tão verdes para os que são amados
Como para os que o não são.
Sentir é estar distraído.
Alberto Caeiro
Eu GOSTO do Bairro Alto à noite. Adoro jantar naquele ambiente acolhedor e ecléctico. Há imensos sabores por onde escolher e, regra geral, é-se bem atendido e bem servido.
Eu DETESTO o Bairro Alto após a meia-noite. O bairro invadido pela parafernália do copo atrás de copo. Pelos meninos imberbes que se passeiam a ensopar garrafas de litro de tinto ou cerveja como prova indiscutível da sua masculinidade. Pelos trintões e quarentões com as suas jeans, as suas camisas brancas ou pretas (atenção porque tem de ser mesmo branca ou preta... nothing in between) e os seus risos made to look cool mal estudados. Por estes machos último grito eu nutro um especial desagrado. Não porque se vistam todos de igual. Riam todos da mesma maneira. Ou seja óbvio o atropelo de uma quiçá boa identidade pessoal por uma má identidade de grupo. Mas porque abomino a forma como deixam cair o verniz só para chegar primeiro ao balcão das bebidas. Onde estão os cavalheiros? Na noite do BA parecem ser uma raça, francamente, em extinção...
Hoje ouvi dizer, que depois de ter anunciado oficialmente o fim da existência do limbo, o Vaticano anuncia agora o fim da existência do Diabo - e do Inferno “propriamente dito’ (o que quer que seja que isso queira dizer). Independentemente de ser ou não verdadeira a negação papal da criatura e do seu habitat, a verdade é que as coisas nunca serão assim tão simples...
A palavra diabo tem a sua origem na palavra grega Diabolon, que surge da junção de “dia” (separar) e “bolon” (outro). Ou seja, o outro que mantemos separado de nós, por o sabermos parte de nós. O outro lado de nós. O oposto. O negativo. Acho que Rui Veloso lhe chamou o nosso lado lunar. E eu acho que é um bom termo. Muito melhor que “diabo”.
Eu diria que o Vaticano se enganou (a ser verdade a tal notícia). O “diabo” continua a existir. É, como sempre foi, aquela parte de nós menos controlável, mais negra, menos lógica, mais descontente. Que persistirá enquanto existirmos. Mais modesta ou mais exuberante. Mais inerte ou mais activa.
E quanto ao desaparecimento do Inferno, também discordo - enquanto houverem "diabos" (pessoais ou colectivos) haverão infernos: privados ou mediatizados, silenciosos ou gritantes.
NOTA: Parece-me importante reforçar aqui uma ideia: eu acredito na liberdade, muito particularmente na liberdade de cada pessoa professar o seu credo. Mal está o homem que não tem fé - seja numa religião, numa filosofia, num sonho ou noutra coisa qualquer. A fé alimenta o nosso lado bom. Faz-nos acreditar que é possível ir mais longe. O que me preocupou neste texto, foi exprimir uma noção que acho basilar para se ser um bom crente - independentemente daquilo em que acreditemos. E essa noção é que o bom e o mau provêm ambos de nós e, que dessa forma, todos temos a responsabilidade de responder face ao que acontece em nosso redor, e o dever de tentar fazer mais e melhor do que fazemos.